Quando a segurança destrói a essência

Quando a segurança destrói a essência

Contexto

Há locais que fazem despertar memórias de vidas passadas, experiências profundas que trazem consigo memórias carregadas de aprendizagens. Algumas vezes “caiu” sem planear nestes locais outras vezes existe um chamado para ativar determinadas memórias. Neste caso a história que vos conto foi acedida na igreja de São Domingos, em Lisboa. Afamada igreja, conhecida por pegar fogo sempre que é reconstruida.

Já há alguns meses que me andavam a empurrar para lá passar, mas não estava preparado para a avalanche de mensagens e por isso dei sempre com o nariz na porta. Há uns dias, a fazer tempo para um evento, reparei que estava aberta e foi quando toda esta visualização chegou até mim. Partilho convosco algumas das mensagens que me foram passadas, desta vida passada mas que ainda encontra pontos comuns com as presentes que vivemos.

Mensagem da igreja de São Domingos

Choravas intensamente, quase que me atrevo a dizer que choravas pelos dois, por tudo aquilo que eu não fui capaz de chorar naquele momento. Ouvi mais do que simplesmente o teu choro e dor, ouvi também os gritos e as palavras de ódio da plateia onde eu próprio estava. Uma plateia segura, uma plateia que me matou por dentro.

Hoje tenho um novo nome, um nome que é símbolo de liberdade mas também símbolo de um preço demasiado elevado a pagar. Decidi mudar, tomei a decisão com base em medo e opressão, não foi uma escolha simples mas no momento parecia o mais seguro a fazer. Abandonar a nossa herança é mais do que mandar fora uns conceitos e dias festivos, é assumir que gerações inteiras morrem ali, naquele mesmo momento connosco. Fugi para uma cidade banhada de luz, onde pensei que poderia ser possível viver a paz e integração. Com fama de acolher povos de todos os quadrantes. Mas foi sol de pouca dura, rapidamente as ameaças tornaram-se mais constantes e o medo começava a oprimir os meus para as ruas e becos mais escuros da cidade.

Chegou o momento de sobreviver renegando tudo o que aquilo que me tornava a pessoa que era. Não mudei apenas o meu nome, matei os ancestrais e trai a minha própria alma. Cego, acreditei que estava a trair-me apenas a mim, que não te levaria comigo para um lugar negro de dor, assumi que a minha segurança seria também a tua.

Agora, mudado, não posso mais regressar ao beco onde vives, eles vão perceber que a mudança é falsa! Preciso perpetuar a mentira de viver seguro enquanto apunhalo todas as minhas crenças.

Não queria aqui estar, só queria estar vivo, mas agora que aqui estou penso que preferia ter ido contigo, porque enquanto o teu corpo se torcia de dor o meu coração morria de forma agoniante. O meu novo nome deu-me o pesado privilegio de estar na fila da frente quando o cortejo de corpos odiados passava. Arrastavam-te pela rua com o teu nome original associado a palavras de ódio e repudio. Junto do meu ombro houve homens que te cuspiam e eu só podia estar ali, a morrer por dentro. Eu cuspi a minha própria alma em praça pública. A assumir uma escolha segura, escolhi a morte mais lenta e dolorosa.

Compreendi ali a dura lição do que realmente pode custar escolher a segurança em função da nossa essência. A escolha segura pode ser dolorosa e pode destruir o teu coração.

Não houve mais nada que salvasse a minha alma depois daquele dia em plena praça pública, a assistir à morte de tantos que me eram queridos. Na plateia deixei morrer a herança, a história e a magia da minha individualidade.

Não deixei chacinar novamente tanta informação, irei manter viva a chama da essência única no meio do nosso coletivo.

Ao perdão de todos os que se converteram. Por todos os que nunca negação as suas heranças.

Canalização de vidas passadas na igreja de são domingos de lisboa